segunda-feira, novembro 06, 2006

Mancha

Lennart Goldmann
Arrasta esses delgados joelhinhos pelo carpete imundo, arrasta. Mas faz isso com vontade, porque quero poder ver as manchas de sangue que deixarás marcando o trajeto pelo qual vais passar até chegar aos meus pés. Quero que teu arrependimento e tua culpa fiquem manchados no chão da minha sala de estar para que eu me lembre dos traços do teu rosto, em súplica, cada vez que me deitar nele, devorando a próxima vítima.
Te ajoelha diante de mim. Estira tuas costas e desce teus ombros perante os dedos vermelhos pelos quais tanto sorriste e chora, mas chora com vontade. Chora alto porque quero poder ouvir teus soluços mesmo em meio aos gritos e sussurros dos próximos que virão, e que também colocarão seu peso sobre o meu e que também me farão juras nunca cumpridas; e que também serão expulsos, mas que nunca ocuparão teu espeço, tua cavidade, minhas obscuras cavernas.
(Mistura tuas lágrimas com meu suor. Mistura tuas lágrimas com as minhas.)
E assim, com o rosto molhado e os joelhos em carne-viva, enrola teus finos dedos sobre o salto do meu sapato e te ergue vagarosamente. Vai subindo aos poucos, aos pedaços , sobre as minhas lisas e negras meias de naylon, e quando sentir e renda que envolve minha coxa encostar na tua face, te envereda e te embebeda com a única dose que ainda posso te dar - do pouco do muito que ainda permanece vivo de ti em mim.