terça-feira, julho 03, 2012

Entre línguas

Pascal Renoux
Um ar gélido invade sua espinha dorsal, subindo até a ponta, até o pescoço e fazendo com que ela desperte. Os poros se contraem, os pelos eriçados revelam seus sentidos.
A sensação de vazio e desproteção, mesmo em uma cama quente e em meio a tantos lençóis - que se misturam desordenadamente com pernas e braços - não a impedem de senti-lo, de farejar seu odor. E ela espreita.
Sente a mão tocar sua coxa, apalpar suas nádegas, deslizar pelos quadris, contornar a cintura, subir pelos ombros e enredarem-se bruscamente nos longos fios de cabelo espalhados pelo travesseiro branco. Uma segunda mão agarra seu maxilar com austeridade impedindo-a de fugir das mordidas ferozes. Mordidas úmidas, pelos ombros, pescoço - a língua escorregadia percorre e delimita o caminho da próxima dentada - passa pelas maçãs do rosto, rosadas, quentes... Incorrem pelos lábios penetrando-a. Duas línguas.
Seus mamilos se enrijecem. As mãos que antes seguravam bruscamente seu maxilar tomam certa delicadeza e agarram-nos, pelas pontas - sentem a textura, impedindo que se amoleçam novamente. Sob movimentos desordenados, cuidadosos, mas constantes - sob doses homeopáticas de prazer os dedos os mantêm no mesmo estado rijo, quente.
Na falta das lágrimas o suor os une. O calor faz com que as gotas evaporem dos corpos e inundem o ambiente com um aroma da mistura de peles, de desejos, de fluídos.
As pernas amolecem - ela já não domina seu corpo. As pupilas dilatadas não a deixam enxergar - ela já não precisa.
Ele conhecia seu orgasmo, invadia sem cerimonia - ela não usava roupas, não se cobria com lençóis, nem com sua vergonha.
No interior um do outro, as mentiras estavam cobertas - de costas ele não poderia ver o sorriso, a testosterona no canto da sua boca.
Invasão desmedida, imperfeições na soleira da porta.
O ar gélido se instala no seu estômago enquanto todo o calor do corpo se transfere para a ponta dos dedos dos pés e sobe compulsivamente por entre suas pernas até que...
Num último suspiro o corpo arrepia, estremece e relaxa.
Os compassos ofegantes da respiração agora são sua única companhia.
Lençóis sobre os corpos.
IML na portaria.