domingo, abril 15, 2007

Ich riech blut...

Seu vagaroso cruzar de pernas podia revelar o que ele não podia ter, e suas palavras possuíam a atroz capacidade de denunciar tudo o que ele não queria saber.
Em seus movimentos friamente calculados ele se perdia, já não conseguia juntar cada palavra que ela pronunciava em meio às tragadas hostis que dava no cigarro. Mal sabia, inebriado com os reflexos avermelhados do sol que intensificavam o contraste do verde dos olhos que o fitavam com o dourado da pele que os emoldurava, sobre exatamente o que ela dissertava.
Observava cada gesto, cada piscar de olhos, cada levantar de sobrancelha, enquanto a imaginava de joelhos, de costas, com seu perfume impregnando suas mucosas olfativas – certamente mera fantosmia.
E por todas as semanas era assim.
O som era só o da sua voz, levemente rouca, sensual, mas em seu mundo particular eram seus sussurros que ele ouvia, pedindo para parar, pedindo mais – gritando. E cada palavra, e cada som o levavam mais fundo.
Sentiu-se ruborizar. Sentiu-se aquecer e esqueceu-se do lugar onde estava ou do que era – sabia-se apenas homem.
Virou-a de quatro enquanto levantava sua saia e invadia suas curvas roçando a barba por fazer na lisa e macia pele.
Ele não se inquietava com os gritos de dor ou de prazer, porque em seu fervor a única coisa que desejava era penetrá-la mais e mais. Tantas vezes quanto seu corpo agüentasse.
Seu desejo era controlá-la, tê-la em seu poder – sempre tão intocável, sempre tão Mona Lisa - por mais que ele tentasse examiná-la por ângulos diferentes sempre sabia que ela o observava e sempre com o sorriso perturbador e convidativo que o inquietava. Era por isso que tinha certeza de que ela desveladamente, mas de forma tênue, pedia por tudo aquilo.
Pedia para ficar de joelhos, pedia para inclinar suas nádegas cada vez mais e enfiar sua cara no travesseiro, porque seus gritos abafados o excitavam. Pedia suas mãos amarradas por trás das costas – afinal, não era por tudo isso que teria se tatuado; não fosse pelo seu desejo oculto de que ele a possuísse por trás, daquela forma tão feroz. Ela não arrastaria seus joelhos pelo tapete balançando os quadris e olhando-o por cima do ombro com um leve sorriso no canto da boca se não estivesse, em seu íntimo, pedindo.
E ele sabia que ela queria mais. Ele sentia que ela o provocava e persuadia da forma mais baixa – que usava da sua falsa inocência para trazê-lo para perto, para acordar o indivíduo ínfimo que morava em suas entranhas.
Enquanto uma de suas mãos transpassava pelos seus quadris controlando a freqüência e a força de seus movimentos, a outra derramou o que restava do vinho pelas suas costas e num ligeiro movimento sua língua percorreu o trajeto vermelho traçado, como se lambesse o sangue da vítima a ser devorada – um breve couvert. Segurou-a pela nuca enroscando seus dedos pelos cabelos e puxou-a para si enquanto ouviu seu último grito.
Lentamente seus dedos deslizaram pela pele úmida que possuiu, apertando seus culotes, suas coxas, como um agradecimento. Abandonou o corpo inerte no chão da sala.
Observando o cadáver refletido pelas luzes do vitrô e da clarabóia, únicas testemunhas da verdade que morava entre aquelas quatro paredes, começou a ouvir como em volume crescente a mesma voz intermitente que havia o levado ao transe.
- Preciso fumar – sinal de que nosso horário já está se esgotando. Já deve ter alguém à sua espera do lado de fora... Volto na próxima semana, Dr. Saulo.

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Som-ambiente (clique-veja): Big Girls Don't Cry - Fergie
Gorjeta: "Eu ainda não sabia o que era essa história de se apaixonar feito um cachorro e não conseguir se afastar tranqüilamente de uma mulher. E dizia a mim mesmo: "Um homem não pode perder o controle nunca". Eu pensavaa como um líder, com o controle absoluto na mão. E gostava muito de mim: eu, o implacável. Depois, os anos passaram por mim. e muitas coisas aconteceram". (O Insaciável Homem-Aranha, Pedro Juan Gutièrrez)